É bom ter TDAH?

TDAH

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“Eu devo ter tê dê agá”, diz aquele sujeito que não presta atenção em nada numa reunião. “Sei lá, preciso fazer um teste, porque ando muito irritado”, diz outro que acha ser hiperativo porque cobra os subordinados, os quais considera lentos no cumprimento das tarefas.

Itupeva

“Vi uma reportagem e me identifiquei com os casos descritos, e então eu acho que tenho algo do espectro autista”, todo psiquiatra já ouviu isso em consulta. Sem contar o já clássico “a psicóloga da minha esposa a ouviu falar de mim e sugeriu que eu tivesse algum tipo de autismo.”

A informação sobre qualquer problema de saúde faz bem. A população em geral precisa ter realmente acesso a estes assuntos, em linguagem acessível. Os profissionais de saúde precisariam conversar melhor com os pacientes, para diminuir as dúvidas e até as consultas ao Google. Mas isso é outra história.

Em relação especificamente ao TDAH, temos dois fatores que preocupam: o auto diagnóstico, fruto da percepção desordenada e sem sentido de que se trata de uma pandemia, e a demanda pelo uso das medicações para o TDAH com o declarado intuito de mitigar sintomas mas que no fundo esconde o real desejo, que é garantir uma melhor performance ao melhorar a concentração para trazer melhores resultados, seja no trabalho, seja numa prova de concurso.

Trata-se de um problema que cresce nas consultas. Um bom parâmetro que também cresce nestes dias são os testes neurodiagnósticos que ajudam a nortear o diagnóstico e também a argumentação ante aos pacientes.

O que estivemos notando nestes últimos meses é que cada vez mais aparecem pacientes interessados nos exames como que para justificar algo que eles não gostam em si mesmos. Todos temos algumas limitações pessoais, e é realmente difícil conviver com elas.

Algumas estão arraigadas de tal forma que a impressão é a de que não vão se resolver nunca. O que não quer dizer que sejam sintomas de doença e daí tenham que ser melhoradas com um remédio controlado.

Podem ser abordadas de outra forma, e consideradas de um jeito mais leve. Nesta era de tanta informação e cobrança por performance, pode ser que esteja difícil conviver com os próprios defeitos, mas é preciso saber que o esforço para minorá-los não diminui com o uso de um psicotrópico.

Uma pílula não vai fazer o trabalho da mudança, que tem que ser feito para uma vida melhor e mais produtiva.

Procrastinação é sintoma de TDAH? Não, mas se for, assuma o problema e faça um cronograma. Esquecer compromissos é sintomas de TDAH? Não, mas se for, anota na agenda do celular e põe um alarme na hora.

Irritabilidade é sintoma de autismo? Talvez seja, mas tente praticar a empatia pelo menos para não demonstrar irritação de maneira a se colocar em risco ou a permitir que uma injustiça aconteça.

Claro que pode fazer o teste neurodiagnóstico, ou qualquer outro que indicarem. Mas que seja feito para começar o processo de melhora. E não apenas para justificar o começo do remédio.

é bom ter TDAH

A Medicina, a Psiquiatria se desenvolvem com o passar do tempo. Mas que sirva para melhorar a vida das pessoas. Do jeito que anda a coisa, há que se ter cuidado, pois em se mapeando tudo para enquadrar num sintoma, daqui a pouco não restará um vivente completamente são.

Autor: Dr Michel Matias Vieira – Médico Psiquiatra, Diretor Clínico do Hospital Psiquiátrico Itupeva

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